Talvez essa forma de
dizer, escrever e gravar o que sinto já esteja ultrapassada, ou simplesmente
ignorada. Não é por isso que deixarei de descrever aqui os fatos que me
atormentam desde que coloquei meus pés na noite sem fim.
Coração partido
pode parecer para você algo passageiro, um simples sentimento que vem e que
volta, mas para nós que vivemos em plena solidão é algo sem igual. Alguns
escolhem não sentir nada e se tornam animais, outros aprendem a controlar suas
emoções se entregando aos prazeres da
noite. Eu escolhi o pior caminho. Senti meu coração morto e atrofiado ser
arrancado de meu peito. Falarei de como
sentir sem ter ao menos um coração vivo e pulsante. Curioso o que os séculos te
trazem.
Ao inicio de
nossas vidas, ou não vidas, somos bombardeados por sentimentos confusos e
atrapalhados que nos fazem optar pelo lado monstruoso de nossa natureza, nunca
soube de um caso diferente. Os novatos não conhecem o verdadeiro terror do
tempo, sentem-se poderosos e felizes por serem eternos, mas a eternidade esmaga
qualquer expectativa. Depois de mais de um século vivo, apenas sobra uma
carcaça de remorsos, dizem que os seres que transcendem os mil anos se tornam
semi-deuses e sua consciência é totalmente destroçada. Vou dizer o que sinto.
A metrópole por
sua figura instigante, onde o que você procura pode ser encontrado, ou estar
procurando exatamente por você. Foi numa noite, uma noite de verão, calor
abafava o horizonte e deixava o céu limpo com estrelas piscando para imensidão,
ela me disse que o amor era pleno e que não importava o que nos detivesse
ficaríamos juntos. Nunca esqueci aquele sentimento, aquela junção de desejo,
encanto e admiração por um ser tão delicado e com tamanho poder, o pode te
trazer luz, de iluminar um pouco esse fundo poço chamado eternidade. Eu
transbordava alegria e satisfação ao seu lado, cada encontro, cada noite eram
eternas, aquelas poucas horas se tornavam inesquecíveis, mas eu sou um animal,
uma besta, um ser perverso. Claro que ela não sabia da minha verdadeira face, a
face da noite, a solidão, a triste sina de quem morreu mas não foi pro inferno.
Por um deslize deixei que visse por trás da mascara, deixei que percebesse que
eu não era algo bom para ela, apesar de tanto esforço para conseguir ser bem a
ela, eu falhei, e perdi o controle. Meus dentes entraram em seu pescoço como
uma faca em um pote de manteiga, ela não resistiu, consentiu, olhou no mais
fundo ponto de meus olhos e enxergou aquele animal que lhe feria, disse com um
brilho. Até mais. Se foi, morta. Pânico! Entrei em tamanho frenesi que fui
expulso da cidade e enviado as masmorras, preparadas para aqueles que ameaçam o
fino véu da mentira que separa o meu mundo, do seu mundo. Abaixo dos suntuosos
castelos do velho continente, se encontram aqueles julgados a enfrentar a chama
do sol.
Talvez isso não
faça diferença agora, já se foram tantos anos esquecido nesse buraco, os ratos
me mantém vivo, não vejo nada, nem ninguém, e apenas o que me restou foi este
velho gravador, aqui deixo meu recado aos mortos que vagam pelas cidades e aos
vivos que não fazem ideia do vos cerca, jamais deixe que a besta tome conta de
você, nunca perca aquilo que te faz acordar, não permita que o que pensa sobre
o que é estrague tudo aquilo que quer ser, seja para quem ama, plenamente
satisfatório, deixe que tal pessoa te faça melhor, seja melhor para que tal
pessoa também seja, vivo ou morto.