Caminhava ele, sozinho, como sempre, vagando pelas ruelas de
uma cidade em frenesi. Pensava em qual caminho seguir? Não, isso nunca o
preocupou, sempre seguindo a maré, acabou entrando neste mundo por simples
capricho do destino.
Três dias atrás tinha
encontrado um deles, era uma garotinha. Matá-la deixou marcas. Não se engane
ele não queria se livrar delas, ele queria deixar que elas se agarrassem a sua
alma, assim se sentiria humano, remorso era o único sentimento válido em seu
corpo. Apenas uma carcaça oca e sem propósito.
O motivo para caçá-los? Por muitos momentos nem se lembrava
de qual era. Conversa antiga, ele não se importava mais com isso, apenas fazia
o que fazia.
Naquela noite em especial estava melancólico como não estivera
em dias. Foi ao bar, no porto, lugar nojento, imundo, apenas os vermes excluídos
pela metrópole frequentavam. Não fazia mal, afinal era um deles. Encharcado de uísque,
saiu horas depois, vagando novamente.
Consigo uma estaca e uma arma calibre 22, proteção, contra
os vivos e contra os mortos. Estava na metrópole fazia anos, conhecia muito bem
a noite interminável que a dominava, sabia muito bem onde encontrá-los e dar
cabo sem ser descoberto. Nunca conheceu quem fizesse o mesmo que ele, mas
conheceu muitos que se entregaram ao prazer que eles ofereciam. Nos clubes da
cidade era fácil ver jovens se drogando e sendo levados para o lado obscuro
dessa cidade, na verdade ele não sabia se ainda existia outro lado.
Uma duvida o atormentava: CAÇAR? A voz em sua cabeça dizia
para julgar e punir todos os malditos responsáveis por levar aquela garotinha,
a voz de sua consciência já quase inexistente, dizia que hoje não era um bom
dia para ir atrás deles. A razão não foi ouvida, mas qual era a razão para ele?
Qual era o limite do certo e do errado? Não sabia mais diferenciar essas coisas
mundanas, deixara de ser sensato á muitos anos atrás. Caçar é pesado, doloroso,
apesar de não serem humanos agora, já foram, um dia, e provavelmente estavam
daquele jeito por culpa de algum imortal sádico que transformava até
menininhas.
Uma busca no local onde encontrou a garota, uma ida ao bar
mais frequentado, já tinha as pistas que precisava. Era experiente. Descobriu
que a garota fazia parte de um grupo que vivia próximo ao subúrbio, presa
fácil. A maioria deles vivia sozinha, mas em alguns casos grupos eram formados,
talvez por que a imortalidade é solitária? Não sabia, e também não se
importava. Matá-los era o que o mantinha em pé.
Foi ao local, estava vazio, mas ao canto de um dos quartos
algo chamava atenção. Um braço, ele não se surpreendeu a principio, mas ao ver
os restos do corpo espalhados pelo local, ficou furioso. Já tinha visto muitas
bizarrices praticadas por eles, mas era um corpo de uma garotinha, assim como a
garota que matara dias antes. Perguntava-se, se tirou a vida de uma criança
viva, cego pelo ódio aos imortais.
Os rastros do covil o levaram até um beco não muito longe
dali. Era um beco cercado por prédios enormes, apenas uma porta em uma das paredes.
Espreitou pelo local, e como um passe de mágica, já estava dentro do local. Um
cheiro insuportável tomava conta dali, a visão ainda desacostuma a escuridão
total, ouvia gemidos de prazer. Rapidamente tratou de esconder a sua presença aqueles
amaldiçoados eram muito sensitivos. Se tornou neutro e imperceptível. Caminhou
pelo local a medida que sua visão se acostumava, encontrou várias portas
trancadas e um barulho dentro delas, no geral eram gemidos, mas algo chamou atenção.
_Vamos, não deixe sua princesa esperando!
_Mas...er...mas...eu nunca fiz isso...
Não aguentou, arrombou a porta. Não podia acreditar no que
via, simplesmente parecia impossível. Montado sobre o corpo de um homem, estava
a garotinha que matara três dia atrás, sugando seu sangue, enquanto era sugada
por outro deles. Não teve reação. A voz que dizia sempre MATE! MATE! Agora não
dizia nada. Ele entrava em colapso, em sua mente tudo era
esclarecido, seu erro, tentou matar uma garota pensando ser um daqueles
malditos imortais, porém a vida não se esvaiu do seu corpo, algum daqueles
malditos havia transformado a jovem menina.
_MATAR! MATAR! MATAR! MATAR! MATAR! MATAR! MATAR! MATAR! MATAR!
Começou a gritar, enquanto tirava do bolso a estaca e partia pra cima.
Com um golpe da estaca, o primeiro virou sangue espalhado
pelo chão. Voltou-se para a garotinha dizendo.
_MALDIÇÃO! ERRO! ERRO! ERRO! MORTE! MEREÇO!
Sacou a 22 que estava na cintura, colocou-a sobre a cabeça.
PAAAM! Um tiro roubava sua vida. Por um momento sentiu a libertação, pois em
sua cabeça não havia vozes e em seu
peito nada de dor.
_Pobre criança! Tirou a vida ao pensar ser culpado por minha
existência, mas devo parabenizar pelo que fez por minha metrópole, limpou as
ruas daqueles que não respeitam as leis que criei. Venha! Você não merece
morrer ainda, vamos caminhar mais uma vez por este mundo, venha lhe darei vida
e propósito, verás que a morte é uma dádiva...